O Nexus Água-Energia-Alimento e sua Relação com Soluções baseadas na Natureza

Escrito por Fabielle Martins/Revisado por Fernando Magalhães

Introdução

A gestão integrada de recursos naturais tem se tornado cada vez mais necessária diante dos atuais desafios socioambientais. Entre os conceitos que emergem nesse contexto, o Nexus Água–Energia–Alimento (FEW Nexus: Food-Energy-Water Nexus) destaca-se pela capacidade de evidenciar as interdependências entre esses três recursos essenciais. Embora frequentemente analisados de forma isolada, água, energia e alimentos formam um sistema profundamente conectado: a escassez ou má gestão de um deles afeta diretamente os demais.

Essa abordagem integrada tem ganhado relevância tanto no âmbito acadêmico quanto em políticas públicas, buscando soluções que garantam segurança hídrica, energética e alimentar de maneira sustentável. Nesse sentido, as Soluções baseadas na Natureza (SbN) surgem como alternativas promissoras para enfrentar esses desafios, ao restaurar e aproveitar processos ecológicos fundamentais.

Este artigo apresenta uma síntese introdutória do conceito de Nexus e discute como as SbN podem contribuir para transformar o uso e a gestão de água, energia e alimentos, a partir de exemplos práticos aplicados em diferentes contextos.

O que é o Nexus Água–Energia–Alimento?

O Nexus FEW é um conceito desenvolvido para evidenciar as interdependências entre água, energia e alimentos, destacando a necessidade de gestão integrada e sustentável desses recursos. Escassez hídrica afeta diretamente a produção agrícola e a geração de energia; por sua vez, a produção de alimentos pode tanto demandar grande quantidade de água quanto gerar resíduos que se convertem em energia. Já o setor energético, além de influenciar o uso de recursos hídricos, também viabiliza sistemas agrícolas e infraestruturas de abastecimento.

Essas relações demonstram que ações tomadas em apenas um dos setores podem gerar efeitos positivos ou negativos nos demais. O Nexus, portanto, propõe uma abordagem holística que permita decisões mais estratégicas, eficientes e alinhadas com a sustentabilidade.

O tema tem sido amplamente estudado por pesquisadores brasileiros, como Fernando Magalhães e Paula Paulo, do INCT SbN, que contribuíram para o livro The Water-Energy-Food Nexus: What the Brazilian Research Has to Say (ISBN 978-65-88304-07-5; DOI 10.11606/9786588304075). No capítulo “Relationship between resource-oriented sanitation and the Nexus approach: water, energy and food perspectives on management and technologies”, os autores exploram o potencial das SbN para fortalecer sinergias entre os três setores.

Como as SbN podem transformar o uso de água, energia e alimentos

As Soluções baseadas na Natureza oferecem alternativas sustentáveis e inovadoras para promover a integração dos recursos no contexto do Nexus. Elas restauram ecossistemas, aumentam a resiliência ambiental e reduzem dependências de infraestruturas convencionais de alto impacto. A seguir, são apresentadas diferentes dimensões nas quais as SbN podem atuar.

1. SbN para a Gestão Sustentável da Água

A conservação e restauração de ecossistemas aquáticos e terrestres desempenham papel central para garantir a disponibilidade e a qualidade da água — um recurso fundamental para agricultura e energia. Exemplos incluem:

• Restauração de bacias hidrográficas, que aumenta a infiltração, reduz o assoreamento e melhora a recarga de aquíferos.

• Sistemas agroflorestais, que aumentam a capacidade do solo de reter água e reduzem a demanda por irrigação.

Ao proteger a água, protege-se também a produtividade agrícola e a segurança energética.

2. SbN para a Produção Sustentável de Alimentos

A agricultura moderna enfrenta desafios como erosão, degradação do solo e contaminação das águas. As SbN contribuem para minimizar esses impactos. Entre as práticas mais eficientes estão:

• Agricultura regenerativa, com técnicas como rotação de culturas e cobertura vegetal, que melhoram a infiltração de água, reduzem a erosão e aumentam a fertilidade do solo.

• Proteção de zonas úmidas naturais, que funcionam como filtros para efluentes agrícolas, diminuindo a poluição de rios e reservatórios.

Com isso, a produção de alimentos torna-se mais eficiente e menos dependente de insumos externos.

3. SbN para Energia Renovável e Eficiência Energética

A transição energética depende de soluções limpas e de baixo impacto, e as SbN desempenham papel significativo nesse processo. Entre as contribuições destacam-se:

• Produção de bioenergia, por meio da conversão de resíduos orgânicos em biogás, reduzindo o desperdício e gerando energia renovável.

• Infraestrutura verde urbana, como corredores vegetados e arborização, que diminuem o uso de ar-condicionado ao promover resfriamento natural.

Essas soluções reduzem o consumo energético e fortalecem a sustentabilidade das cidades.

4. SbN para Infraestrutura Verde e Resiliência Climática

A intensificação de eventos extremos, como enchentes, secas e ondas de calor, reforça a urgência de alternativas que aumentem a resiliência das cidades e dos territórios. Aplicações relevantes incluem:

• Restauração de manguezais e florestas costeiras, que oferecem proteção natural contra tempestades, erosão e aumento do nível do mar.

• Captação e armazenamento de água da chuva, que garante abastecimento local e reduz pressões sobre sistemas de irrigação e energia.

Cidades que adotam infraestrutura verde tornam-se mais seguras, autossuficientes e adaptadas às mudanças climáticas.

Considerações finais

O Nexus Água–Energia–Alimento evidencia que esses recursos não podem ser gerenciados de maneira isolada. Suas interdependências exigem estratégias integradas que considerem efeitos cruzados e priorizem a sustentabilidade. Nesse sentido, as Soluções baseadas na Natureza representam caminhos eficazes, de baixo custo e de alto impacto para equilibrar produção, conservação e resiliência.

Ao restaurar ecossistemas, melhorar a eficiência do uso de recursos e aumentar a capacidade de adaptação às mudanças climáticas, as SbN reforçam a segurança hídrica, energética e alimentar. Assim, alinham-se diretamente às metas globais de desenvolvimento sustentável e às demandas atuais de planejamento ambiental integrado.